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Retrofit sustentável: uma oportunidade estratégica no reordenamento urbano  

No mês que se celebra o Dia Mundial do Meio Ambiente, uma inquietação surge com uma necessidade urgente de resposta prática. Se estamos mundialmente discutindo questões climáticas e ambientais, muito desse debate se centraliza no crescimento desordenado das cidades, que no passado se preocupou mais com a redução do déficit habitacional, sem se preocupar com o amanhã, ou melhor, no hoje. O hoje exige um novo pensamento: como transformar nossas cidades em espaços mais inteligentes, sustentáveis e resilientes sem precisar começar do zero?

Pensando em apenas uma parte desse grande quebra-cabeças, uma parte da solução desse problema pode estar em uma prática ainda pouco explorada, mas extremamente promissora: o retrofit sustentável.

O conceito de retrofit vai além da modernização estética de edificações mais antigas por integrar ao projeto práticas destinadas a reduzir os impactos ambientais que um edifício tradicional gera, promovendo eficiência no uso de materiais sustentáveis e dos recursos naturais.

Na construção civil, retrofit tende a ser um sinônimo de “requalificação”, justamente porque seu conceito supera o de uma simples reforma. Ele tem como finalidade a requalificação de uma determinada edificação, cuja destinação inicial era comercial ou industrial, transformando-a em residencial, visando a ampliação de oferta de novas moradias. Esse modelo utiliza parte da estrutura original do edifício, modernizando suas instalações e incorporando a ele novos equipamentos para torná-lo mais atrativo e sustentável, gerando, consequentemente, valorização do imóvel.

Emprega-se na modernização da construção novas tecnologias e soluções que atendam às exigências atuais de conforto, segurança e sustentabilidade. E quando o retrofit é feito incorporando ideias de proteção ambiental, esse processo passa a ser uma solução relevante para os desafios urbanos contemporâneos, sobretudo nos grandes centros.

Incorporar ao projeto elementos como fontes de energia renovável – painéis solares, sistemas de reuso de águas pluviais, telhados verdes, ventilação e iluminação natural e compostagem de resíduos orgânicos – constitui prática que transforma essas obras em modelos de desenvolvimento urbano sustentável, pois o resultado disso é a redução do consumo de energia elétrica e uso de materiais poluentes e redução da produção rejeitos sólidos.

A adoção dessas ideias nos projetos de retrofit e a implantação dessas transformações nos edifícios contribuem diretamente na gestão sobre os serviços públicos de saneamento, coleta e destinação de lixo e recuperação de áreas degradadas, além de gerar economia financeira ao condomínio.

Como consequência disso, municípios enxergaram no retrofit sustentável uma maneira de reduzir os custos com gestão ambiental.

Reconhecendo o impacto positivo desse modelo, diversas cidades brasileiras adotaram políticas de estímulo como a concessão de incentivos fiscais para implantação de projetos de retrofit com práticas sustentáveis.

Exemplo disso é a instituição do IPTU Verde[1], que importa na redução de IPTU, além de estabelecer procedimento facilitado para o licenciamento dessas obras de requalificação, e ainda promovendo o aumento do potencial construtivo para essas obras.

Inclusive, tramita no Congresso o PL 6.046/2019[2], que prevê incentivos fiscais para a adoção de tecnologias verdes em prédios, permitindo aos municípios estabelecer regimes especiais de licenciamento, benefícios fiscais e outros meios de incentivo para a implantação de tecnologias como instalação de coberturas vegetadas e reservatórios de águas pluviais, pois a adoção dessas soluções teriam o potencial de minimizar os impactos negativos da urbanização e garantir a sustentabilidade e resiliência das cidades. Além desse, existem outros projetos em tramitação no país que buscam conceder benefícios fiscais para aquisição e emprego de materiais sustentáveis, reutilizados ou reciclados.

Há tempos a sustentabilidade deixou de ser apenas uma tendência. Na verdade, ela é uma obrigação legal. A Constituição Federal prevê o direito de todos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, diante de sua repercussão na vida da sociedade. A legislação infraconstitucional, como a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente[3], a Lei de Política Nacional de Resíduos Sólidos[4], a Lei das Águas[5], entre outras, reforçam a preocupação com a manutenção dos recursos naturais e a degradação do meio ambiente, estabelecendo uma responsabilidade compartilhada entre todos, Poder Público, iniciativa privada, terceiro setor e sociedade, na proteção ambiental.

Nesse sentido, o retrofit sustentável se consolida como oportunidade estratégica. Incorporadoras, investidores e proprietários que optarem por adequar seus imóveis a critérios ESG (ambientais, sociais e de governança) agregam valor aos empreendimentos, aumentam sua atratividade no mercado e se antecipam a exigências legais cada vez mais rígidas.

A requalificação de imóveis, nessa esteira, dialoga com o conceito de cidades inteligentes e com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável[1] (ODS) da ONU. Ao reutilizar estruturas existentes e otimizar seus recursos, o retrofit reduz a necessidade de novas construções urbanas, ao mesmo tempo, contribui para o aumento da vida útil de equipamentos públicos urbanos de coleta e tratamento de esgoto e rejeitos e resíduos sólidos, colaborando para o adensamento sustentável e a revitalização de regiões centrais.

Pensando no futuro, está mais que hora de compreender que retrofit sustentável não é apenas uma alternativa moderna. É uma resposta concreta à crise ambiental. É uma ferramenta de justiça social urbana e, numa análise mais profunda, uma exigência da legislação ambiental brasileira.

Dessa maneira, o retrofit sustentável se apresenta como uma boa oportunidade de investimento imobiliário. Projetos que integram práticas sustentáveis atraem investidores, valorizam ativos, reduzem custos operacionais e se beneficiam de incentivos fiscais. Em um cenário cada vez mais regulado e exigente, quem se antecipa e adota soluções verdes posiciona-se na vanguarda de um setor que já entende: sustentabilidade é rentável, estratégica e essencial.

 

Autor:

Sobre o autor: Thiago Soares – Advogado coordenador no escritório Lopes Domingues Advogados. Especialista em Direito Imobiliário e Processual.

Referências:

[1] IPTU Verde é um incentivo fiscal que concede descontos no Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) para imóveis que adotam práticas sustentáveis, como captação de água da chuva, reuso de água, energia solar, telhados verdes, entre outras ações ecológicas. O objetivo é estimular construções e reformas sustentáveis, promovendo a preservação ambiental e o uso racional dos recursos naturais nas cidades. Disponível em: https://capital.sp.gov.br/web/perus/w/noticias/61687. Acesso em: 5 jun. 2025.

2 Senado Federal. PL 412/2022 – Política Nacional de Economia Circular. Disponível em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/139856. Acesso em: 5 jun. 2025.

3 Brasil. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm. Acesso em: 5 jun. 2025.

4 Brasil. Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010. Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12305.htm. Acesso em: 5 jun. 2025.

5 Brasil. Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997. Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9433.htm. Acesso em: 5 jun. 2025.

6 Nações Unidas Brasil. Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/sdgs. Acesso em: 5 jun. 2025.

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