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Qual a importância de registrar o contrato de locação não residencial na matrícula do imóvel?

 

 

A decisão de locar um imóvel urbano para o estabelecimento de atividades comerciais sempre representou um dilema para o setor empresarial. Diversos fatores devem ser ponderados na escolha do modelo mais adequado: definição do ponto comercial, o momento econômico da empresa, o projeto de expansão e o desenvolvimento sustentável do negócio.

Essa decisão adquire especial relevância quando envolve investimentos expressivos, pois o empresário busca, além do retorno econômico, a segurança jurídica necessária para proteger o capital investido. Afinal, o êxito do empreendimento está diretamente relacionado à estabilidade e à previsibilidade que o ambiente contratual proporciona ao longo do tempo.

A aquisição do imóvel pode, em um primeiro momento, parecer a alternativa mais segura, sobretudo diante da proteção que o direito de propriedade confere ao titular do domínio. Contudo, os custos inerentes à compra (como preço, tributos incidentes e despesas cartorárias) somados aos investimentos de adaptação do imóvel ao negócio podem tornar a aquisição economicamente inviável.

Alternativamente, em muitos casos, a locação apresenta-se como a solução mais compatível com o ciclo de desenvolvimento da empresa, ainda que desperte receios quanto à segurança da posse e à continuidade do ponto comercial.

A locação de imóveis, especialmente quando envolve adequações físicas significativas, suscita compreensíveis incertezas ao empresário. A maior delas diz respeito à possibilidade de alienação do imóvel pelo proprietário durante a vigência contratual da locação e, consequentemente, ao risco de rescisão antecipada da locação, já que a transferência da propriedade confere ao adquirente o direito de denunciar a locação e exigir a desocupação em até noventa dias, conforme dispõe o art. 8º da Lei de Locações (Lei nº 8.245/91). Trata-se de um risco estratégico que pode comprometer a continuidade das atividades empresariais e a preservação do fundo de comércio.

Sob o ponto de vista jurídico, o ponto comercial configura uma forma de propriedade imaterial do empresário, e a legislação busca assegurar a sua proteção. Desde o Decreto nº 24.150/1934, o ordenamento demonstra preocupação em preservar o fundo de comércio, garantindo ao locatário o direito de permanência no imóvel em determinadas circunstâncias. A Lei de Locações, ampliou essa proteção, estendendo a tutela da empresa ao prever a possibilidade de manutenção da locação em caso de alienação do imóvel.

O art. 8º da Lei de Locações estabelece verdadeira superação do princípio da relatividade dos contratos ao permitir e extensão de seus efeitos ao terceiro adquirente, obrigando-o a respeitar o prazo de vigência pactuado para locação e suas demais disposições até o seu termo. Essa prerrogativa confere maior estabilidade à relação locatícia e reforça o equilíbrio entre liberdade contratual e segurança jurídica nas relações empresariais.

Para que tal garantia produza efeitos perante terceiros, é indispensável que o contrato de locação seja registrado na matrícula do imóvel. É por meio dessa inscrição que se confere publicidade à existência do contrato, tornando-o oponível ao adquirente e impedindo que este alegue desconhecimento da locação.

A cláusula de vigência com registro em matrícula ocupa posição singular: situa-se entre os domínios dos direitos obrigacionais e reais. Embora oriunda de relação contratual, adquire eficácia erga omnes, projetando-se sobre qualquer pessoa que venha a adquirir o imóvel. Trata-se, portanto, de uma “cláusula com eficácia real”, dotada de publicidade e oponibilidade típicas dos direitos reais.

Ainda que a legislação condicione a oponibilidade da locação ao registro da cláusula de vigência, o Superior Tribunal de Justiça já admitiu, em situações excepcionais, que a ciência inequívoca do adquirente sobre a existência do contrato de locação substitua a necessidade do registro. Nos julgados proferidos nos Recursos Especiais nº 1.322.238/DF, sob a relatoria do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, e nº 1.269.476/SP, relatado pela Ministra Nancy Andrighi, ambos de 2013, entendeu-se que a ausência de registro não impediria a manutenção da locação, desde que comprovado que o adquirente tinha pleno conhecimento da existência e vigência do contrato.

Considerou-se que era possível prescindir do registro, tornando o contrato oponível ao terceiro adquirente, porquanto os documentos carreados aos autos faziam prova quanto a prévia e inequívoca ciência quanto a existência e a vigência do contrato de locação, suprimindo a necessidade da publicidade pelo registro imobiliário, porque a finalidade que o registro busca havia sido atingida: dar publicidade ao contrato e proteger a boa-fé nas relações jurídicas.

Esses precedentes, embora importantes, não afastam a regra geral estabelecida pela lei. A prescindibilidade do registro não deve ser interpretada como dispensa rotineira, sob pena de se fragilizar a segurança das relações locatícias. A omissão da locação na matrícula pode gerar grave insegurança, permitindo que o adquirente denuncie o contrato e determine a desocupação do imóvel. O registro, portanto, permanece como instrumento essencial para a preservação do vínculo locatício e para a estabilidade do ponto comercial.

Embora ainda sejam poucos os locatários que levam seus contratos a registro, a medida é de extrema importância. O registro deve ser realizado com assistência técnica adequada, preferencialmente por profissional habilitado, a fim de assegurar que todas as formalidades legais sejam observadas. Assim, o empresário preserva os investimentos empregados na instalação e divulgação do estabelecimento e evita o risco de denúncia antecipada do contrato.

Em síntese, o registro do contrato de locação não constitui mera formalidade burocrática, mas um instrumento de proteção patrimonial e de continuidade empresarial. Ao conferir publicidade e eficácia perante terceiros, garante ao locatário estabilidade e previsibilidade, elementos indispensáveis para a manutenção do ponto comercial e para o fortalecimento das relações empresariais no longo prazo.

 

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