
Coberturas de IFPD e IPA: Distinções Técnicas e Jurídicas na Contratação e Interpretação Contratual
Por Tatiana Caldeira, advogada da área de Direito Securitário
No âmbito do seguro de pessoas ou comumente chamado de seguro de vida, é recorrente a confusão entre as coberturas por Invalidez Funcional Permanente por Doença (IFPD) e Invalidez Permanente Total ou Parcial por Acidente (IPA). Embora ambas envolvam o pagamento de indenização ao segurado que se encontra incapacitado de forma permanente, suas hipóteses de acionamento, fundamentos técnicos e critérios jurídicos são substancialmente distintos.
A distinção entre essas coberturas não é meramente terminológica, mas sim essencial à adequada interpretação contratual e à delimitação do risco segurado, sendo matéria frequentemente discutida em sede administrativa e judicial.
1. INValidez FUNCIONAL PERMANENTE POR DOENÇA (IFPD): NATUREZAE PRESSUPOSTOS
A cobertura por IFPD tem como pressuposto a ocorrência de quadro clínico decorrente exclusivamente de doença que causa a perda irreversível da funcionalidade do segurado, ou seja, para que fique caracterizada a IFPD é necessário que o segurado, em decorrência de doença perca a sua autonomia, ficando totalmente incapacidade de exercer qualquer atividade do seu cotidiano e dependente de terceiro, operando esta cobertura, na prática, como uma antecipação do capital segurado por morte.
A incapacidade profissional do seguro, ainda que em decorrência de doença, não caracteriza a IFPD, isto porque, ainda que o segurado possa estar incapacitado para exercer a sua atividade laborativa, não necessariamente se encontra incapacitado para exercer as suas atividades do cotidiano, como caminhar, vestir, por exemplo.
Para que fique caracterizada a cobertura de IFPD, quando da regulação do sinistro, se utiliza o Instrumento de Avaliação de Invalidez Funcional (IAIF). O IAIF é uma tabela, composta por dois conjuntos de atividades avaliadas, sendo exigido a pontuação mínima de 60 pontos, em um total de 80 possíveis, para configuração do direito à indenização securitária da cobertura de IFPD.
Portanto, não basta a simples incapacidade por doença, existe a necessidade de preenchimentos de requisitos, como a incapacidade total, permanente, que causa ao segurado a dependência para toda e qualquer atividade do seu cotidiano, a qual será avaliada através do IAIF.
2. INValidez permanente total ou parcial por acidente (ipa): foco nA PERDA ANATÔMICA OU FUNCIONAL
Por sua vez, a cobertura de IPA somente será devida ao segurado, se este vier a sofrer um acidente pessoal, caracterizado por sua natureza externa, súbita, involuntária e violenta, que resulte na perda total ou parcial da funcionalidade de membro ou órgão do segurado.
Para que fique caracterizada a indenização de IPA é necessário que se avalie o grau de comprometimento físico do segurado, em decorrência de perda total ou parcial de um membro ou órgão em razão de acidente típico pessoal.
Por esta previsão, esta cobertura não guarda relação qualquer com a capacidade laborativa do seguro, mas sim com a perda da funcionalidade física em razão de acidente, considerando cada membro ou órgão de forma isolada, havendo, portanto, a possibilidade do segurado, ainda que apto para a sua atividade profissional, receber indenização por invalidez permanente por acidente.
A avaliação da indenização devida é feita com base em tabela percentual estabelecida pela SUSEP, levando-se em consideração a correspondência entre o grau de comprometimento funcional (baixo, médio ou alto) e o percentual relativo do membro afetado previsto na tabela da SUSEP.
Portanto, o valor da indenização a ser paga ao segurado, será relativa ao percentual apurado de acordo com a tabela da SUSEP, não sendo, na maioria das vezes, pago o valor integral do capital segurado previsto na apólice de seguro.
Diferentemente da IFPD, a cobertura de IPA não exige que a incapacidade comprometa a autonomia do segurado ou sua capacidade de autossuficiência, tampouco exige a perda da capacidade laborativa. A perda parcial da função de um único membro, se devidamente enquadrada nos parâmetros técnicos, é suficiente para ensejar o pagamento proporcional da indenização.
3. Distinções jurídicas essenciais entre IFPD e IPA
Elemento Contratual | IFPD (Doença) | IPA (Acidente) |
Fato gerador | Doença que causa a irreversibilidade da funcionalidade do segurado | Acidente pessoal, caracterizado por sua natureza externa, súbita, involuntária e violenta |
Critério de avaliação | Perda funcional global – dependência de terceiros para atividades cotidianas | Perda anatômica ou funcional de membro ou órgão específico, podendo ser total ou parcial |
Instrumento técnico | IAIF – pontuação mínima de 60 pontos em 80 | Tabela da SUSEP para quantificação proporcional da perda, observando o grau de incapacidade (baixo, médio ou alto) |
Capacidade laborativa | Irrelevante para fins de cobertura | Irrelevante – foco exclusivo na perda física do membro/órgão |
Indenização | Total – pagamento integral do capital segurado da cobertura de IFPD | Parcial – pagamento proporcional ao percentual atribuído ao membro lesado |
4. Considerações finais
As coberturas por IFPD e IPA atendem a finalidades distintas dentro do seguro de vida, sendo incompatível sua aplicação por analogia ou interpretação extensiva. A claridade na redação contratual, aliada à correta interpretação jurídica das cláusulas e critérios técnicos, é essencial para a segurança jurídica na liquidação de sinistros e para a mitigação de litígios.
Nosso escritório atua de forma estratégica apoiando seguradoras na condução de demandas judiciais relacionadas à correta interpretação das coberturas de IFPD e IPA, preservando os limites contratualmente estabelecidos.